Ser pai
Ser pai.
Por Fábio Cordeiro
Presidente ONDA-Autismo
Conselho de Autistas
Há 18 anos nasceu meu primeiro filho.
Foi a sensação mais intensa da minha vida, nenhuma outra até hoje se aproximou de como me senti naquele dia.
Ali eu não tinha dúvidas, não pensei no passado e nem no futuro.
Estava totalmente presente ali, naquele momento.
Difícil nesse ritmo em que vivemos estarmos presentes no exato momento em que estamos vivendo, não é?
As pessoas dirigem olhando o celular, jantam enquanto terminam algum serviço do seu emprego que precisam resolver até amanhã.
O amanhã nem é mais amanhã, já que tenho que resolver tudo agora, sempre pensando no amanhã. Mas naquele dia não.
Naquele dia, naquela hora, eu estava ali! Percebi todos os cheiros da sala de parto na maternidade, vi as luzes fortes, senti a visão escurecer e logo voltar para que eu não perdesse nada, eu sentei, levantei, um minuto parecia uma hora como se tudo estivesse em câmera lenta. E ainda bem que foi assim, pois pude sentir cada segundo, sem que houvesse segundos planos, segundas intenções. Era só aquele momento que importava.
Logo eu seria pai. Dezoito minutos de duração do parto que me tornariam pai. Que ilusão, naquele momento eu ainda não sabia que não era um parto que me faria pai. Precisaria de muito mais do que isso.
Ainda, pouco mais de dois anos depois, pude experimentar todo essa comoção novamente. Nascia meu segundo filho e de novo era eu de corpo e mente todo entregue àquela situação.
Dessa vez bem mais calmo, confesso. Só que não foram apenas alguns minutos nessa empreitada. Se dá primeira vez cada minuto pareceu uma hora, nessa, as horas viraram dias e minha calma foi trocada pela eternidade de dias na UTI.
Ainda bem que deu tudo certo, esses dias eternos findaram e fomos para casa todos juntos.
Agora com dois filhos, aí sim eu era um pai! Pois acreditem, não é bem assim.
Mas então, quando me tornei pai?
Se dois filhos não fazem alguém se tornar, um pai então o que pode ser?
Pois bem meus amigos, realmente é fácil pensar que ter filhos é o que te faz ser um pai.
Porém, o que faz um pai não é gerar. Não é quando tenho que sou pai, é quando doo. É quando meus filhos me têm.
Antes deles nascerem era tudo muito voltado para o eu. Durante a gestação eu sonhava como seria para mim ter filhos.
Aliás, é comum falarmos que temos filhos e ter é sinônimo de possuir. Acontece que pai não é ter, é ser!
Não possuímos nossos filhos, são eles outras vidas, outros seres que não nos pertencem. Não são para nós e sim conosco.
Idealizei filhos para satisfazer a mim. Eles chegaram e foram se desenvolvendo da maneira deles, sem dar a mínima importância ao que eu havia idealizado. E foi aí que me tornei pai, quando continuei me doando e aceitei que eles não existem para me agradar ou agradar o que projetei para meu regozijo. Eles estão aqui para juntos sermos quem podemos ser.
Ser pai é todo momento que nos damos aos nossos filhos e temos em troca o amor mais puro que podemos receber.
Expectativas terminam em si mesmas. Às vezes se cumprem, às vezes não. Por vezes são até superadas, porém o mais lindo de tudo é quando descobrimos que quando as criamos, nem mesmo sabemos se essas são as que vão nos trazer felicidade.
Hoje meus filhos mostram-me coisas que nem ousei imaginar e coisas que já julguei importantes para o futuro deles nem eram tão importantes assim.
Em tempo, convém lembrar que posso me perdoar por idealizar, afinal, quando criei essas ilusões eu ainda não era um pai, era apenas um jovem que não tinha aprendido com os próprios filhos. Hoje entendo que muitas vezes a melhor forma de experimentar a vida é como aqueles momentos na sala de parto, vivendo o agora intensamente e estando presente no próprio presente e, com o perdão do trocadilho, meu presente são meus filhos!